DIREITO À CRECHE E À EDUCAÇÃO
Antigamente, vivíamos em
uma sociedade notadamente patriarcal, onde o chefe da família era o homem
(pai), que muitas vezes, saía de sua residência para trabalhar.
Muitas mulheres, naquele
cenário, trabalhavam em casa: cuidavam de seus filhos e dos afazeres da casa.
Hoje em dia, em face de
mudanças sociais ocorridas, com as necessidades econômicas cada vez mais
crescentes, dentre outros fatores, tanto homens como mulheres saem de seus
lares para trabalhar. Como consequência, seus filhos são sendo cada vez mais
deixados com familiares ou em locais como “escolinhas”, creches, etc.
No entanto, infelizmente,
muitos casais de baixa renda, não têm onde deixar seus descendentes, seja por
questões financeiras, seja pela falta de vaga em
estabelecimentos públicos destinados às crianças.
Ocorre que, a Constituição Federal de 1988 exalta a
educação infantil, como forma de propiciar o desenvolvimento integral das
crianças de zero a cinco anos de idade, o atendimento em creches e unidades de pré-escola
(artigo 208, inciso IV, Constituição Federal), etc.
Nessa toada, o Estado tem a obrigação de fornecer
educação básica de qualidade a todas as crianças. Assim, o atendimento da criança em creche é um
direito garantindo constitucionalmente que deve ser respeitado e
efetivado. Todavia, isto está longe de ser devidamente cumprido.
Não obstante um direito advindo da Lei Maior, de a
criança frequentar uma creche, a efetivação dele alcança outros objetivos, como
a proteção ao filho com a consequente “libertação” dos pais para o trabalho,
que, neste caso, é fundamental para o sustento da família.
No âmbito constitucional, o art. 205 põe a educação
como "direito de todos e dever do Estado e da família". Já o art.
208, em seu inciso IV, assim determina:
"Art. 208. O dever do Estado com a educação
será efetivado mediante a garantia de:[...]
IV -
educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de
idade;".
A
creche e a pré-escola visam o desenvolvimento integral da criança, e servem para iniciação das
crianças no ensino fundamental. Por isso, tem-se que a educação infantil é um
direito indisponível que deve ser assegurado às crianças com até seis anos de
idade.
Nesse sentido é o art. 4º, do
Estatuto da Criança e do Adolescente, quando impõe que "É
dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público
assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes [...]
à educação".
Nesse contexto, o art. 53, IV, do referido diploma
legal determina que o Estado deve assegurar "atendimento em creche e
pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade".
Igualmente, o art. 4º, IV, da Lei 9.394/1996
assegura às crianças de zero a seis anos de idade o atendimento gratuito em
creches e pré-escolas.
E no art. 29 também conceitua a educação infantil
como sendo a destinada à crianças de até seis anos de idade, com a finalidade
de complementar a ação da família e da comunidade, objetivando o desenvolvimento
integral da criança nos seus aspectos físicos, psicológicos, intelectuais e
sociais.
Neste diapasão, Selowsky apud SILVA disciplina que:
“Psicólogos, médicos, educadores, antropólogos,
economistas e outros especialistas são unânimes em reconhecer a importância do
devido atendimento às crianças de zero a seis anos de idade. Trabalhos
científicos mais recentes confirmam os mais antigos e comprovaram ser este
período de vida o de menor crescimento, tanto físico, quanto mental, o que
levou, inclusive, á conclusão de que a educação infantil representa, como diz
M. SELOWSKY, “investimento em capital humano”.[1]
A Constituição Federal, art. 211, § 2º também
determina, quanto ao sistema de ensino, que aos sistemas municipais de ensino
compete os cuidados necessários para a institucionalização da educação infantil
em seus respectivos territórios.
Com efeito, a negativa da municipalidade
em fornecer a vaga na creche representa uma grave afronta a Constituição
Federal. Trata-se de um ato abusivo da autoridade coatora. E ainda, não se pode
olvidar que o direito perseguido é líquido e certo, se refere à garantia de
duas crianças de fluírem de seu direito constitucional à educação.
Do Supremo Tribunal Federa, extrai-se:
“CRIANÇA
DE ATÉ SEIS ANOS DE IDADE. ATENDIMENTO EM CRECHE E EM PRÉ-ESCOLA. EDUCAÇÃO
INFANTIL. DIREITO ASSEGURADO PELO PRÓPRIO TEXTO CONSTITUCIONAL (CF, ART.
208,IV). COMPREENSÃO GLOBAL DO DIREITO CONSTITUCIONAL À EDUCAÇÃO. DEVE JURÍDICO
CUJA EXECUÇÃO SE IMPÕE AO PODER PÚBLICO, NOTADAMENTE AO MUNICÍPIO (CF, ART.
211, § 2º). RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E PROVIDO”.
E do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:
“REEXAME NECESSÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA -
MATRÍCULA DE CRIANÇAS EM CRECHE - CRIANÇAS COM 02 ANOS DE IDADE - EDUCAÇÃO
INFANTIL - DIREITO ASSEGURADO PELA CARTA MAGNA (CF, ARTS. 6º E 208, IV) -
OBRIGAÇÃO DO MUNICÍPIO (CF, ART. 211, § 2º) - AFRONTA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO
DOS PODERES - INOCORRÊNCIA - PRECEDENTES - SENTENÇA MANTIDA EM REEXAME.
Sendo a educação um direito
assegurado constitucionalmente, bem como na legislação ordinária, a sua
inobservância pela Administração Pública enseja sua proteção pelo Poder
Judiciário, sem configurar ofensa ao princípio da separação dos poderes.
O Poder Judiciário, desde que
provocado, não pode escusar-se de apreciar lesão ou ameaça de lesão a direito,
nos termos do art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, especialmente quando o
Município deixa de cumprir as determinações constitucionais, in casu, de
proporcionar às crianças entre zero e seis anos de idade o direito individual
indisponível à educação”. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Reexame
Necessário em Mandado de Segurança n. 2011.007420-5, da comarca de Porto Belo
(1ª Vara), em que é impetrante Ministério Público do Estado de Santa Catarina,
e impetrado Secretário de Educação do Município de Bombinhas: ACORDAM, em
Terceira Câmara de Direito Público, por votação unânime, conhecer do reexame
necessário e negar-lhe provimento. Custas legais.
Em face do demonstrado, pode-se assegurar que o
direito à educação possui um alto relevo social e irrefutável valor
constitucional, e uma de suas faces é justamente a garantia de acesso à creche,
e desse modo deve ser posto em prática e é dever do Estado efetivá-lo.
A negativa do Estado em propiciar efetivamente o
atendimento em creche ou pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade
poderá resultar em imensuráveis prejuízos a formação acadêmica e física do
menor, uma vez que se encontra sem amparo educacional e, além disso, sua
família poderá sofrer fortes abalos na renda diante da escassez de recursos
financeiros.
Se o
Estado obriga a família a zelar pela criança, por outro lado deve
fornecer subsídios para este grupo familiar ter condições de arcar com todas as
suas obrigações. Eis o paradoxo.
Autor:Felipe Clement
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Disponível emhttp://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm. Acessado em 17 de outubro de
2011.
________ Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da
Criança e do Adolescente e dá outras providências. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm. Acessado em 17 de outubro de
2011.
________ Lei n.º 9.394 de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as
diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm. Acessado em 17 de outubro de
2011.
________ Supremo Tribunal Federal. RE N. 472.707/SP; Rel. Min. Celso de
Mello; DJU de 4.4.2006. Disponível emhttp://www.stf.jus.br/portal/principal/principal.asp. acessado em 27 de março de
2012.
________ Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Reexame Necessário em
Mandado de Segurança n. 2011.007420-5, de Porto Belo. Relator: Des. Subst.
Carlos Adilson Silva. Data julgamento: 15 de março de 2011. Disponível emhttp://app.tjsc.jus.br/jurisprudencia/. Acessado em 24 de março de 2012.
Nenhum comentário:
Postar um comentário